Há algum tempo me ocorreu, talvez, uma das comparações mais malucas que já fiz: famílias têm muito a ver com cabelos. A idéia me surgiu enquanto secava minhas madeixas. É incrível como a mente pode voar enquanto fazemos alguma coisa tediosa, não?

Eu já havia quase me desembaraçado da tarefa de modelar os fios, quando uma mecha particularmente geniosa me chamou a atenção. Foi então que me veio o estalo: sempre existe uma mecha ruim. Sempre tem aquela parte do cabelo que dá mais trabalho. Assim são as famílias. Vamos às semelhanças.

Assim como nos cabelos, as famílias sempre têm uma “mecha” ruim (ou várias). Há sempre aquele parente que, por um motivo ou outro, sempre dá trabalho. É aquela pessoa que nunca está do jeito que deveria. Dá trabalho nas festas da família, arruma confusão, deixa todo mundo maluco. É aquela mecha de cabelo que está sempre do jeito errado: se você seca o cabelo com as pontas pra dentro, ela fica com as pontas pra fora; é a primeira que arrepia e a que parece sempre estar de mau humor.


Já viram aquela família que parece de comercial de margarina? E cabelo de capa de revista? Pois bem. Saibam que os dois tiveram seus defeitos cui-da-do-sa-men-te escondidos. Precedendo aquele visual meticulosamente arrumado, não se engane, há sempre muito secador, chapinha, bobes, baby liss e produtos high tech envolvidos. E quanto às famílias? Há sempre segredinhos bem guardados, gentilezas, mentirinhas brancas e ciuminhos reprimidos. Os verdadeiros bafafás nunca chegam à tona. Notem que estou falando das famílias tidas como perfeitas, as normais são diferentes e depois falaremos disso.


Outra coisa que pode servir para exemplificar minha ideia maluca é o fato de que estamos sempre pensando que o cabelo (ou a família) dos outros é ótimo. Você vê aquele cabelo liso, chapado, brilhante, que acorda sempre arrumado e diz: nossa, seu cabelo é perfeito! A resposta? Uma lista de defeitos. Ou a pessoa reclama porque ele é muito liso e não há nada que pare nele, ou a pessoa reclama porque é muito enrolado, difícil de cuidar, armado, tem a cor feia, é oleoso, seco, o corte não está bom e por aí vai. Quanto às famílias? Bem, basta ver a quantidade de adolescentes que acha a mãe dos amigos muito mais legal que a sua própria genitora. Aí está a semelhança. E sempre tem alguém que diga – da família ou do cabelo, não importa – “até que é legalzinho (a), mas você não acredita no trabalho que dá”.


E vivemos tentando uma forma de mudar os dois. Tentamos modular o comportamento das pessoas, fazemos críticas, damos conselhos, enchemos o saco, argumentamos, discutimos, conversamos, elogiamos, pintamos, hidratamos, cortamos, secamos, enrolamos, alisamos, reclamamos, nos orgulhamos. O que importa é não parar de tentar mudar, não é?

Pois bem. Familiares e cabelos, os dois se cansam disso tudo. Uma hora ou outra, acabam cobrando os danos causados. Aí surgem as brigas, as desavenças, as cobranças, as pontas duplas, a quebra, a queda. Então corrigimos tudo: fazemos as pazes com a família e os cabelos, cuidamos direitinho, para quando estiver tudo certo, repetirmos tudo novamente.


É uma convivência meio doida, desgastante e maravilhosa ao mesmo tempo.


E pra finalizar, ocorreu-me a coincidência mais fiel e talvez a que acabe com uma possível rabugice do texto. Reclamamos, mexemos e tentamos mudar nossas famílias e nossos cabelos, mas eles são fundamentais. Por mais que dêem trabalho, os fios e a família permitem que nosso sorriso apareça mais bonito.